A Câmara de Populações Indígenas e
Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR/MPF), órgão superior
vinculado à Procuradoria-Geral da República (PGR), divulgou nesta
segunda-feira (29) nota pública reafirmando a inconstitucionalidade do
Projeto de Lei (PL) 490/2007. A proposição, que tramita em regime de urgência
na Câmara dos Deputados, busca alterar o estatuto jurídico das terras indígenas ao introduzir o
requisito do marco temporal de ocupação para os processos de demarcação.
Se
aprovado, o PL condiciona a demarcação das terras tradicionais à presença
física dos indígenas nas respectivas áreas em 5 de outubro de 1988, o que,
para o MPF, representa ameaça ao direito das populações originárias ao seu
território. O texto atual foi aprovado em 23 de junho de 2021 na Comissão
de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC). No entanto, os
deputados aprovaram, na última quarta-feira (24), o requerimento para que a
proposta tramite em regime de urgência. Com isso, o PL pode ser analisado
diretamente em plenário, sem passar por comissões mistas.
Na
nota, o MPF chama atenção para a impossibilidade de se alterar o estatuto
jurídico das terras indígenas (disciplinado pelo artigo 231 da Constituição) por lei ordinária, o
que torna a proposta frontalmente inconstitucional. Além disso, os direitos
dos povos indígenas - em especial à ocupação de seus territórios tradicionais
- constituem cláusula pétrea, integrando o bloco
de direitos e garantias fundamentais que não poder ser objeto sequer de
emenda constitucional.
“A
Constituição garante aos povos indígenas direitos originários sobre as terras
que tradicionalmente ocupam, sendo a tradicionalidade um elemento cultural da
forma de ocupação do território e não um elemento temporal. Fixar um marco
temporal que condicione a demarcação de terras indígenas pelo Estado
brasileiro viola frontalmente o caráter originário dos direitos territoriais
indígenas”, destaca a nota.
Ameaças
– Se
aprovada, a tese do marco temporal consolidaria inúmeras violências sofridas
pelos povos indígenas, como as remoções forçadas de seus territórios, os
confinamentos em pequenos espaços territoriais e os apagamentos identitários
históricos.
Outro
aspecto considerado crítico é a possibilidade contida no PL 490/2007 de
contato forçado com populações em isolamento voluntário para a realização de
“ação estatal de utilidade pública”. Essa medida também se mostra
inconstitucional, pois a Carta Magna reconhece expressamente o dever de
respeitar a organização social, costumes, línguas, crenças e tradições dos
indígenas.
Segundo
o documento, o direito de se manter em isolamento voluntário diz respeito à
autodeterminação dos povos, princípio consagrado na Convenção 169 da Organização Internacional
do Trabalho (OIT) e na Declaração das Nações Unidas Sobre os
Direitos dos Povos Indígenas. Ambos os normativos foram incorporados ao
ordenamento jurídico brasileiro.
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