sexta-feira, 19 de junho de 2020

200619 - Carta (x) Banco Mundial

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Quais as atribuições do cargo de Weintraub no
Banco Mundial
Ex-ministro da Educação é indicado pelo governo brasileiro e precisa de chancela de outros países. Função envolve habilidades diplomáticas e salário alto









































































A quinta-feira (18) foi um dia de agito na política brasileira. No mesmo dia da prisão de Fabrício Queirozamigo pessoal do presidente Jair Bolsonaro e ex-assessor de Flávio Bolsonaro – em imóvel do advogado da família presidencial, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, teve sua demissão confirmada.
A situação de Weintraub nunca foi estável, mas se tornou mais delicada em maio de 2020. Foi quando o ministro do Supremo Celso de Mello divulgou a íntegra de uma reunião ministerial ocorrida no Planalto no mês anterior. Num dos trechos, Weintraub chama os integrantes do Supremo de “vagabundos” e defende mandá-los para a prisão. No domingo (14), o então ministro da Educação se encontrou em Brasília com militantes radicais, que são alvo de um outro inquérito criminal no Supremo. Além de se solidarizar com os bolsonaristas, Weintraub reafirmou os ataques ao tribunal. A ideia de sua demissão, a partir daí, ganhou força no Planalto.
Em vídeo publicado nas redes sociais na quinta-feira (18), Weintraub, ao lado de Bolsonaro, anunciou a saída do ministério. Sem entrar em detalhes sobre os motivos da demissão, ele diz que recebeu convite para ser diretor do Banco Mundial.
Na manhã de sexta-feira (19), o ex-ministro disse no Twitter que está saindo do Brasil o “mais rápido possível”, e que “não quer brigar”. Também na sexta-feira, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) entrou com um pedido no Supremo Tribunal Federal de apreensão do passaporte de Weintraub, assim como sua proibição de sair do país. O pedido foi protocolado no âmbito do inquérito das fake news, sob o qual o ex-ministro é investigado.
WEINTRAUB NO BANCO MUNDIAL
A ida de Weintraub ao Banco Mundial não ocorre a convite do órgão internacional. Ele é resultado de uma indicação feita pelo governo federal, confirmada na noite de quinta.
O cargo a ser ocupado pelo ex-ministro é o de diretor-executivo no conselho administrativo do banco. A cadeira está vaga desde outubro de 2019, quando o economista Fabio Kanczuk deixou a função para ser diretor de política econômica do Banco Central. Weintraub irá completar o mandato de dois anos de Kanczuk, que foi iniciado em outubro de 2018 – ou seja, o ex-ministro da Educação fica só até outubro de 2020.
O conselho administrativo do Banco Mundial é formado por 25 cadeiras. Há países que, por terem maior poder de voto dentro da organização – definido, resumidamente, pelos aportes feitos ao banco e pelo papel desempenhado na economia mundial – , têm cadeiras próprias. É o caso de EUA, Japão, China, Alemanha, França e Reino Unido. O restante das cadeiras é ocupado por blocos divididos por critérios geopolíticos. Cada um desses grupos é chamado de constituency.
A cadeira do Brasil é dividida com outros oito países: Colômbia, República Dominicana, Equador, Haiti, Panamá, Filipinas, Suriname e Trinidad e Tobago. Portanto, Weintraub terá que representar esses outros países ao exercer a função de diretor-executivo.
Para ser confirmado no posto, Weintraub precisa do aval do conjunto de países que compõem a cadeira no conselho administrativo. Dentro do grupo onde está incluído, o Brasil é o país com o maior poder de voto – 2,24% do total do Banco Mundial. Como os votos do Brasil superam a soma dos outros oito países do grupo, isso significa que, mesmo que todos os outros países votem contra, o ex-ministro ainda assim poderá ser aprovado para o cargo.
AS FUNÇÕES DO CARGO
O conselho administrativo do qual Weintraub fará parte define quais projetos terão envolvimento do Banco Mundial. E, conforme explicou ao Nexo Caio Borges, advogado do Instituto Clima e Sociedade, a agenda do órgão tende a ser contrária às ideias defendidas pelo governo de Jair Bolsonaro.
“A agenda da mudança climática é muito forte dentro do Banco Mundial, que também é muito vocal sobre políticas de igualdade de gênero. São agendas que vemos que são secundárias ou até mesmo enfrentadas pelo governo brasileiro”

Caio Borges
Coordenador e advogado do Instituto Clima e Sociedade
Como representa mais de que seu país, um diretor-executivo deve compor com o restante dos membros do grupo. Para isso, é necessário ter conhecimento técnico das ações do órgão e manter boas relações políticas com os representantes de outros países. À CNN Brasil, Otaviano Canuto, que ocupou a cadeira entre 2016 a 2018, explicou que o posto requer “habilidade diplomática e de articulação”. Portanto, a função diplomática pode exigir que Weintraub, como diretor-executivo, tenha que contrariar pautas conservadoras e “antiglobalistas” que marcaram sua gestão no Ministério da Educação.
Em nota publicada na quinta-feira (18), o Ministério da Economia confirmou a indicação de Weintraub para a cadeira, justificando a escolha por sua formação como economista, sem mencionar experiências ou habilidades ligadas à diplomacia. Formado em economia pela USP (Universidade de São Paulo), Weintraub trabalhou por 18 anos no Banco Votorantim (rebatizado de BV no final de 2019), onde chegou a ser economista-chefe. Deixou o grupo em 2012, indo para uma corretora de investimentos. Em 2014, tornou-se professor do curso de Ciências Contábeis do campus da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), do qual se licenciou para participar do governo de Jair Bolsonaro.
O AUMENTO SALARIAL
O cargo no Banco Mundial também significa para Weintraub um aumento salarial substantivo. A remuneração anual de um diretor-executivo do órgão é de US$ 258,5 mil – R$ 1,38 milhão, pela cotação de 19 de junho de 2020.
A cada mês, portanto, o ex-ministro da Educação irá receber R$ 115 mil. O valor multiplica por mais de três aquilo que recebia como chefe do MEC (R$ 31 mil mensais).
AS REAÇÕES À INDICAÇÃO
Em entrevista coletiva na quinta-feira (18), o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), comemorou a saída de Weintraub do Ministério da Educação – reação consensual entre políticos da oposição ao governo Bolsonaro. Maia também comentou a ida do ex-ministro ao Banco Mundial.
“No Banco Mundial? É…Porque não sabem que ele trabalhou no Banco Votorantim, que quebrou em 2009, e ele [Weintraub] era um dos economistas do banco”

Rodrigo Maia
Presidente da Câmara dos Deputados
Maia se referia provavelmente às dificuldades de caixa que o banco enfrentou entre 2008 e 2009. Meses depois da eclosão da crise financeira global, o Banco do Brasil comprou 49% do banco Votorantim. No Twitter, Weintraub rebateu a declaração de Maia, negando que o banco tenha quebrado.
Membros da sociedade civil também se posicionaram em relação ao novo cargo ocupado pelo ex-ministro da Educação. Uma carta que contou com a assinatura de mais de 150 organizações da sociedade civil, acadêmicos, empresários e artistas foi enviada a representantes dos outros oitos países que compõem a cadeira do Brasil no conselho administrativo do Banco Mundial.
No documento, são listados motivos para que a indicação de Weintraub ao posto seja rejeitada. Aparecem na lista a priorização de uma agenda ideológica sobre evidências científicas, a paralisação do Ministério da Educação sob seu comando e episódios que refletem uma conduta pouco tolerante do ex-ministro. Uma frase da carta resume sua mensagem:
“O Sr. Weintraub é a antítese de tudo que o Banco Mundial busca representar nas áreas de política de desenvolvimento e multilateralismo”

Carta da sociedade civil
Enviada aos países que compõem conjuntamente a cadeira do Brasil no Banco Mundial
O documento contou com a assinatura da ONG Conectas Direitos Humanos e de nomes como Chico Buarque, Maria Alice Setúbal, Fernando Meirelles e Rubens Ricupero.
O CÓDIGO DE ÉTICA DO BANCO MUNDIAL
Membros do Banco Mundial ouvidos pelo Estado de S. Paulo apontaram que Weintraub deverá se adaptar às regras adotadas pela instituição relacionadas à ética. Pelo código de conduta, os integrantes do órgão devem cumprir com um padrão ético e ser discretos nas redes sociais.
Durante os 14 meses de mandato no Ministério da Educação, Weintraub acumulou polêmicas e tornou-se nome forte das mídias sociais bolsonaristas. Contingenciou recursos das universidades federais e foi alvo dos primeiros grandes protestos de rua contra o governo Bolsonaro; comandou um ENEM marcado por falhas; é investigado pelo crime de racismo após uma postagem em que acusava a China de ter tramado um plano para dominar o mundo com a pandemia do novo coronavírus, usando o personagem Cebolinha, da Turma da Mônica, para depreciar o modo de falar dos chineses. Além disso, em meados de 2020, passou a ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal no inquérito das fake news, que investiga ameaças contra os membros da corte.

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