terça-feira, 15 de outubro de 2019

191015 - Quem foi Paulo Freire




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Paulo Freire está inserido dentro de um contexto histórico. Na década de 1960, o Brasil era rural e analfabeto. A Constituição de 1946 negava o direito ao voto a quem não sabia ler ou escrever. O "povo" estava excluído da participação política e, por isso, de qualquer ação política: se o "povo" não votava, por que fazer alguma coisa pra "ele"? Paulo Freire surgiu como o criador de um "método" de alfabetização para adultos, no interior do Nordeste, na década de 1960. Partindo da vivência dos alfabetizandos, conseguiu transmitir-lhes a educação formal em tempo recorde. O "método" - por falta de uma palavra melhor - mudaria completamente o rumo eleitoral do país, pois incluiria milhões de novos eleitores no mapa eleitoral, se adotado como política de Estado. Jango, quando assumiu, tinha como mote de campanha as Reformas de Base. Jango mais falou do que fez. Além da futura (e nunca praticada) Reforma Agrária, tinha a intenção de pôr em prática o "método" freirista. Foi um alvoroço na política brasileira. Político, no Brasil, tem medo do "povo". Político tem medo de mudar as estruturas de desigualdades, que os sustentam e lhes garantem dinheiro, eleição e poder. Na época, chamaram de "intenções comunistas" dar cidadania política ao brasileiro. Era do direito ao voto que falavam. Mas para a política conservadora tratava-se de "doutrinação". O Golpe de 1964 foi a desculpa encontrada. No país, a "doutrinação comunista" é usada, via de regra, como desculpas para golpes de Estado. Vide a Intentona Comunista e o Estado Novo. Não mudamos muita coisa, pois os eleitos de hoje ainda vivem sob a égide da Doutrina de Segurança Nacional.
Pensar Paulo Freire fora desse contexto: da Guerra Fria, dos insistentes golpes militares das décadas anteriores a 1964, da Doutrina de Segurança Nacional baseado na CIA, do reacionarismo de um país escravocrata, dos mandonismos e coronelismos seria um grande erro.
Pensar que o problema da educação se resume a um único homem é o sinal de que o problema da educação atinge gerações. O país sempre cagou para educação formal. É algo que podemos perceber inclusive nos governos de esquerda, do Partido dos Trabalhadores. Criamos uma memória coletiva de que a Ditadura Militar promovia uma educação de qualidade, mas esquecemos - ou nunca pesquisamos - que a Constituição de 1967 retirou a porcentagem mínima obrigatória que antes era destinada a educação. Os governos militares fizeram uma escolha: ao investirem maciçamente em infraestrutura, abdicaram do investimento em políticas sociais. Foi nos governos militares que o país crescia e o salário mínimo diminuía. Foi nos governos militares que as estruturas de desigualdade aumentaram consideravelmente. A partir da década de 1970 e 1980, com a neoliberalização do mundo e a diminuição da importância do Estado, o setor de serviços, que era, até então, eminentemente público, foi deixado à iniciativa privada. A educação passou por processo semelhante. Assim, no Regime Militar, abriu-se caminho para a iniciativa privada com a diminuição dos investimentos públicos, em todas as áreas: educação, segurança, habitação. A classe média, que tinha papel importante de cobrança e mobilização por uma educação de qualidade, migrou para o novo sistema. A educação pública do país passou a ser constantemente deixada de lado, sem a pressão política de uma classe que conseguia mobilizar o país, ao contrário do "povo". Enquanto o serviço público continuar sendo um serviço de "pobre", do "povo", de parcela excluída da sociedade, incapaz de se mobilizar, os serviços serão ruins, incluindo, aí, a educação. A educação de qualidade deveria ser um projeto nacional. Culpar Paulo Freire pela educação ruim é desconhecer a História do Brasil. Desconhecendo a História, que é uma ciência, com métodos e rigor científico, estamos malfadados à manipulação, à direita e à esquerda.

Um comentário:

  1. Oi, Marcos, tudo bem por aí? Muito bacana ajudar a disseminar conhecimento, fico feliz em ter visto credibilidade em minhas palavras. Mas tenho uma dica: se o senhor voltar ao vídeo, eu atualizei meu comentário e inseri todas as referências que usei para construir esse texto. Mais uma vez, obrigado. Sigamos, juntos!

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